14 de julho de 2010

Me encontrar





Deixo-me inundar pela satisfação. Ela vem, muitas vezes, antecipada, pisando levemente o piso do assoalho das minhas aspirações. Tenta não esbarrar na mobília, não deixar com que o toca-disco pule e arranhe o LP, não quer que a música grite estridente e me chame a atenção.

Eu estou relaxado. E por muito tempo estive cansado. Me agarrando forte no cachoalhar do ônibus lotado, esbarrando o corpo inerte de um lado pro outro, entre tantos outros corpos inertes, tantas caras vazias e olhos sem expressão. Ou olhos vazios e caras sem expressão. De qualquer forma, mesmo entre tantos estranhos, e entretanto, me vendo tão claramente nos seus rosto, não é muita gente que desce no mesmo ponto que eu.

Deve ser porque, agora sim, estou no ponto. E num ponto sem volta, onde a chegada me mostra que é o fim. Em que o início se faz novamente, bem na volta, naquela curva molhada de chuva que eu escorreguei de bicicleta. Nesse ciclo em círculo chamado cotidiano.

Eu reparo bem de canto de olho. Eu continuo andando disfarçado na minha própria sombra, assobiando uma música sem melodia pra distrair o susto, e vejo alguém parado no asfalto. Sentada na beira da calçada, com as pernas cruzadas, olhando para as estrelas. Cara de menina, jeito de mulher. A imponência de um sorriso doce rasgando o céu cinza de tom amargo.

Perdida moça? E ela olha pra mim atravessando a minha existência. Me sinto abraçado pela oportunidade do destino e de mãos dadas com a escolha certa. Perguntei se estava perdida, mas na verdade quem precisava se encontrar era eu.

Você gosta de Blues? Ela me diz que prefere Jazz. E no improviso dessa música nos beijamos.


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