5 de março de 2010

Domingo em casa


No momento de tristeza tudo é uma agulha. Tudo é tremor, e não arrepio.
O uivo do vento já não acaricia, apenas sussurra. A angústia é irmã-prima da felicidade que disse que voltava depois de buscar o café, o mesmo café amargo que me queima a garganta e arranha os ouvidos no gemido das horas.
Ela foi e não prometeu voltar, nem deixar a porta aberta, nem deixar a agenda aberta, nem deixar o telefone livre.

O pior do arrastar das horas não é o tempo gasto, o tempo perdido, o tempo passado, são as marcas no chão. O arrastar das correntes, por carregar coisas pesadas pela sala. Eu tentei mudar a mesa de lugar sozinho, mas o piso marcou. Desculpe, meu bem.

Ainda sinto o cheiro do café pelo quarto.

Pela janela o dia de hoje é igual ao daquele nosso dia, só que água não vem do céu, brota dos meus olhos e escorrem pra debaixo da cama. A cama desarrumada, as cartas amassadas, as memórias atrasadas, o livro de nossos dias.

O sabor amargo, o resto de beijo correndo pela boca, querendo acontecer, e o café que não vou tomar do seu lado.

Ainda olho pra porta e não consigo sair, não saio pra rua,não saio na estrada,não saio na chuva, porque a estrada é longa e fria, por enquanto não quero mais me molhar, não quero sair.

Já sou intruso de mim mesmo, por não saber onde estou.

2 comentários:

  1. Bonito mesmo... "só que água não vem do céu, brota dos meus olhos..." Lindo, lindo!

    eu sou a Carla, gostei da sua visita e gostei do seu cantinho tbm! Volte sempre, tá? :)

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  2. Noossa, Léo!
    Este texto é simplesmente divino! *-*
    Você produz nele umas imagens tão vivas, embora o personagem já não queira viver na plenitude, que prende o leitor também neste quarto, nesta solidão, nesta saudade.
    Adorei!

    Beijos!
    Ana

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